Quase 10 da noite. Uma multidão de pessoas na parada de
ônibus. Centro da cidade. Ruas escuras e uma ventania que traz consigo o odor
fétido do lixo acumulado na calçada.
Cerca de 30 pares de olhos anseiam por avistar o ônibus. Ah,
o amado ônibus que a esta hora voa pelas avenidas e nos conduz para o sossego
de nossas casas.
À minha frente, uma jovem . Celular em punho, na altura dos
olhos. Digitava. “Estou sentindo muito a sua falta, só agora percebo como te
amo de verdade”. E naquele momento realmente a invejei. Invejei a sua hesitação
em escolher as palavras certas, a falta de pressa em construir as frases.
Invejei sua insegurança ao apertar o botão de enviar. Apagou, reescreveu,
procurou por pontos e vírgulas. Buscou aspas. Parou, ajeitou o cabelo, olhou
para o horizonte como se buscasse uma certeza. Parecia não ter pressa.
Ah, como eu gostaria de estar no lugar dela sentir um pouco
desse sentimento confuso, sem nome. Ter dúvidas. Tentar a sorte outra vez.
Camaragibe (príncipe). Sem guardar o celular, a moça correu
para o seu ônibus e partiu em busca dos seus sonhos.
Senti-me ainda mais amarga. Senti-me um vazio na noite. Peguei
meu ônibus também, mas não tinha um rumo.